Nova Delhi:
Nos dois mandatos distintos e nos 20 anos em que foi Primeira-Ministra do Bangladesh, os protestos em curso que causaram a morte de mais de 300 pessoas são talvez o maior teste para Sheikh Hasina. Pelo menos 98 pessoas foram mortas e centenas ficaram feridas no domingo, quando a polícia usou gás lacrimogéneo e balas de borracha para dispersar dezenas de milhares de pessoas que exigiam a demissão do primeiro-ministro Hasina. A violência marcou um dos dias mais mortíferos na história recente de agitação civil no Bangladesh, ultrapassando as 67 mortes registadas em 19 de Julho, quando estudantes protestaram contra o sistema de quotas para empregos públicos.
Mas o que levou à agitação mortal em Bangladesh?
Os protestos, que começaram no final do mês passado, aumentaram dramaticamente quando activistas estudantis da Universidade de Dhaka, a maior do país, entraram em confronto violento com a polícia e contra-manifestantes pró-governo. As raízes destes protestos residem num controverso sistema de quotas, que reserva até 30% dos empregos públicos para familiares de veteranos da guerra de independência do Bangladesh contra o Paquistão, em 1971.
Os manifestantes argumentam que este sistema é discriminatório e favorece os apoiantes do partido Liga Awami do primeiro-ministro Hasina. Defendem um sistema baseado no mérito para substituir a quota existente.
O sistema de quotas, estabelecido em 1972 e brevemente abolido em 2018, antes de ser restabelecido, tem sido uma fonte persistente de discórdia. Os críticos afirmam que isso beneficia injustamente os apoiadores da Liga Awami e limita as oportunidades para outros candidatos qualificados. As observações públicas do Primeiro-Ministro Hasina inflamaram ainda mais a situação, levando a protestos intensificados.
Os protestos evoluíram para além da questão das quotas e transformaram-se num movimento antigovernamental mais amplo, atraindo o apoio de diversos sectores da sociedade, incluindo estrelas de cinema, músicos e até fabricantes de vestuário. Canções de rap e campanhas nas redes sociais amplificaram os apelos à renúncia de Hasina.
O primeiro-ministro Hasina, que governa desde 2009 e garantiu um quarto mandato consecutivo em Janeiro através de eleições boicotadas pelo principal partido da oposição, o Partido Nacionalista do Bangladesh, enfrenta acusações de consolidar o poder através de instituições estatais e de suprimir a dissidência. A violência recente realça a crescente insatisfação e as exigências de mudança entre a população do Bangladesh.
Escalação Rápida
Os estudantes que protestam anunciaram hoje um programa “Marcha para Dhaka”.
Casas de representantes públicos, 20 escritórios da Liga Awami, esquadras da polícia e outras instalações governamentais foram atacadas, vandalizadas e incendiadas em 39 distritos. Foram relatados confrontos entre manifestantes e líderes da Liga Awami e das suas organizações associadas em vários distritos.
Residências e escritórios de ministros do partido no poder, ministros de estado, parlamentares e líderes da Liga Awami foram vandalizados em pelo menos 14 locais diferentes.
Em resposta à agitação, o governo declarou um recolher obrigatório a nível nacional por tempo indeterminado a partir das 18h00 de domingo, a primeira medida desse tipo durante a actual onda de protestos. Um feriado geral de três dias também foi anunciado a partir de segunda-feira. Além disso, o governo desligou os serviços de Internet.
Os manifestantes bloquearam as principais estradas e lançaram um programa de não cooperação, aumentando a violência em todo o país. As esquadras da polícia e os gabinetes do partido no poder tornaram-se alvos, com relatos de confrontos graves e de vítimas significativas. Treze policiais foram espancados até a morte em Sirajganj e as casas de dois legisladores foram incendiadas.
A agitação não se limitou a Dhaka, mas espalhou-se por todo o país. No distrito central de Munsiganj, dois trabalhadores da construção civil foram mortos e 30 ficaram feridos durante um confronto entre manifestantes, polícia e activistas do partido no poder.
Outros confrontos em Pabna, Feni, Lakshmipur, Narsingdi, Rangpur, Magura e outros distritos resultaram em vítimas adicionais. Em Dhaka, um hospital foi vandalizado e quatro fábricas de vestuário foram incendiadas. A decisão do governo de encerrar os serviços de Internet de alta velocidade, incluindo plataformas de redes sociais, aumentou o caos.
Ordens Governamentais
Os fornecedores de telecomunicações do Bangladesh foram instruídos a encerrar os serviços 4G, desactivando efectivamente o acesso à Internet. Os protestos inicialmente pararam depois de o Supremo Tribunal ter eliminado a maior parte das quotas, mas recomeçaram esporadicamente, exigindo justiça para os mortos.
O Chefe do Estado-Maior do Exército de Bangladesh, General Waker-Uz-Zaman, instruiu os oficiais a garantir a segurança de vidas, propriedades e instalações do Estado. Apesar disso, os manifestantes continuaram a desafiar o recolher obrigatório, provocando novos confrontos e vítimas.
A comunidade internacional, incluindo a Índia, aconselhou os cidadãos a não viajarem para Bangladesh.