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Na sexta-feira, 30 de agosto, a Assembleia da República de Portugal publicou um petição de esclarecimento do artigo 122Ksim Lei dos Estrangeiros, lei 23/2007. Elaborado pela advogada Priscila Corrêa, brasileira radicada em Braga, o documento afirma que a Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) vai contra o que está estabelecido na legislação.

Segundo Priscila, a interpretação da AIMA mistura dois artigos da Lei dos Estrangeiros, acabando por criar critérios próprios para concessão da autorização de residência aos filhos de estrangeiros. “O artigo 122.ºK prevê que os pais de filhos residentes em Portugal que efetivamente prestem apoio e educação aos filhos não necessitam de visto para obter autorização de residência. Contudo, de acordo com as orientações hoje praticadas pela AIMA, estas crianças estariam abrangidas pelo artigo 92.3, que apenas fala do ensino secundário. Pode-se dizer que a AIMA decidiu legislar, e, com isso, restringir o que o legislador fez”, afirma.

A petição pede três alterações no funcionamento da AIMA: que seja aplicado o artigo 122, inciso K, abrangendo crianças a partir dos seis anos de idade (idade escolar); que o agendamento seja feito para pais de crianças a partir desta idade; e que o agendamento eletrônico seja ampliado para os pais que considerem o reagrupamento familiar.

Pelo que está estipulado no regulamento do parlamento, com mil assinaturas, quem propor a petição será ouvido por uma comissão da Assembleia da República. Se forem alcançadas 7.500 assinaturas, a petição será apresentada no plenário do parlamento português.

Priscila estabeleceu o prazo de 180 dias para a petição, sendo o prazo final até 26 de fevereiro. “Mas acredito que esse número será alcançado muito mais cedo. Acredito que, em novembro ou dezembro, já teremos mais de 7,5 mil assinaturas”, afirma.

Ela fala sobre o objetivo que pretende alcançar com a petição. “O que eu quero é a oportunidade de ser ouvido no parlamento e para isso bastam mil assinaturas. Quero que o parlamento esclareça o que está escrito na lei. AIMA tem uma interpretação própria, que não é correta. Tenho essa bandeira há oito anos e gostaria de resolver essa situação”, relata.

Interpretações da lei

O advogado destaca que a lei que prevê a isenção de visto para obtenção de autorização de residência aos pais que sustentam e educam os filhos pode ter duas interpretações. “Um é o mais abrangente, que inclui qualquer criança que esteja em creche ou jardim de infância. Não há como negar que, mesmo em creche, estão realizando atividades educativas”, explica.

Numa visão mais restrita, indica que apenas a escolaridade obrigatória, prevista em lei, pode ser considerada como “proporcionando educação”. “A interpretação mais restritiva apenas considera obrigatória a educação, ou seja, o ensino básico a partir dos seis anos. Isso, de acordo com a lei da educação básica”, afirma.

Uma parte que não fica clara no artigo 122K da Lei dos Estrangeiros é a utilização do termo residente, que permite confundir quem vive em Portugal com quem tem autorização de residência. “Em toda a legislação, sempre que diz quem tem o documento, diz titular do título ou titular da autorização de residência. Mas apenas dizer residente pode criar confusão. Talvez devesse ser substituído por um morador”, relata.

Ela diz que a AIMA tem uma regra que não está na lei. “Para efeitos de concessão de autorização de residência aos pais de alunos consideram-se apenas aqueles que frequentam o ensino secundário. Tal como em alguns países europeus, o ensino secundário é considerado a partir dos 12 anos. A AIMA estabeleceu que só pode requerer autorização de residência quem tenha filhos a partir do sétimo ano de escolaridade”, detalha.

Momento estranho

O presidente de Aliança PortuguesaFábio Knauer, concorda com a petição. “Acredito que é importante que fique claro para que não haja dúvidas sobre a forma como a AIMA interpreta a lei. Vivemos um momento tão estranho, que simples regras de direito, como a questão do agendamento, não estão a ser cumpridas”, afirma.

Para Knauer, a AIMA não pode estabelecer uma idade ou frequência de ano letivo para cumprir a lei. “O artigo K não determina uma idade específica. A AIMA deve obedecer às leis definidas pela Assembleia da República. Se o órgão estabelece idade, isso não tem base na lei”, considera.

Ele continua: “A lei diz que você pode ter isenção de visto desde que o responsável seja responsável pelo sustento e pela educação. Não há nada na lei que defina a idade e isso é ilógico. Afinal, qual é a diferença entre uma criança de 10 e uma criança de 13 anos? Se um filho é dependente, de que adianta ter limitação de idade ou de ano letivo?”, reitera.

Via judicial

O advogado Bruno Gutman acredita que o caminho não é a petição a apresentar na Assembleia da República. “Entendo que se a AIMA o fizer, quando a lei não prevê qualquer restrição de idade ou ano de escolaridade, é oportuno tomar medidas legais”, afirma.

Para Gutman, a AIMA vai contra a lei nestes casos. “Em princípio, a AIMA está violando a lei. Se a AIMA estiver aplicando mal a lei, o caminho é o tribunal. O papel do judiciário é exigir o cumprimento da lei. Infelizmente, este é o caminho.”

Quando questionado se isso não limitaria o cumprimento da lei a quem tem dinheiro para pagar um advogado, ele indica o que pode ser feito. “Você tem que buscar justiça gratuita. A Ordem dos Advogados dispõe de advogados inscritos no regime jurídico livre. A pessoa tem que ir à Segurança Social, dizer que não tem recursos para pagar um advogado, e vai-lhe ser atribuído um advogado sem pagar. Quem vai pagar o advogado é o Governo”, relata.

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