João Batista Coelho, de casaco desportivo azul, está à porta da sua loja, enquanto a mulher observa, com a mão na boca, como que tomada pela emoção.

A loja de Rambo é uma das cerca de 45 mil empresas na capital do estado que foram afetadas por essas enchentes devastadoras. A Câmara dos Dirigentes Lojistas de Porto Alegre estima que o custo total para o comércio na cidade foi de 487,7 milhões de reais (US$ 91 milhões) entre 29 de abril e 26 de maio.

As inundações começaram no final de abril, depois que chuvas torrenciais inundaram a cidade e as montanhas circundantes. As águas inundaram as cidades e desembocaram no rio Guaíba, que corre ao longo de Porto Alegre, fazendo com que a água subisse cerca de 5,33 metros (17,48 pés) acima do normal – níveis nunca antes vistos.

A máxima anterior foi de 4,75 metros (15,6 pés) acima do normal, atingida durante as cheias históricas de maio de 1941.

Os proprietários de comércios próximos à orla de Porto Alegre dizem que observaram as enchentes subirem a cada dia, até que o rio chegasse à sua porta e desembocasse em suas lojas e restaurantes.

“Ficamos aqui quase uma semana sem dormir”, disse Eni Verdejo Monteiro, proprietário de meia-idade da Lanches da Tia, uma lanchonete na mesma rua da loja de materiais de escritório do Rambo.

Quando as águas inundaram as instalações de Monteiro e a electricidade foi cortada, ela e o marido descobriram que não havia forma de fechar o grande portão de metal na frente do seu restaurante. Temendo saqueadores, eles decidiram ficar onde estavam.

Eles estavam certos em estar vigilantes. Dezenas de pessoas foram detidas e encarceradas nas primeiras semanas das enchentes, depois de tentarem arrombar e roubar casas e empresas desprotegidas. Só na cidade de Eldorado do Sul, foram roubados US$ 6 milhões em equipamentos e produtos durante arrombamentos em 17 estabelecimentos comerciais.

“Nosso filho estava preocupado”, lembrou Monteiro. “Não tínhamos celular porque ficou sem bateria. Não tivemos contato com ninguém. Sem eletricidade. E a única coisa que se ouviu foram os helicópteros e as pessoas gritando por socorro. Não há como descrevê-lo.”

Assim como Rambo e seu marido, Monteiro e sua família agora estão tentando juntar os cacos.

“Temos que conversar muito sobre as coisas”, disse o marido de Monteiro, João Batista Coelho. “Vamos sofrer um golpe nos próximos dois ou três meses. Tudo será uma perda. Não temos renda. Perdemos geladeira, fogão, armários, balcão.”

E eles têm que pagar aluguel. “O futuro é sombrio”, disse Coelho, contendo as lágrimas. “Mas não podemos simplesmente desistir.”

João Batista Coelho, à direita, e sua esposa Eni Verdejo Monteiro lutam para sobreviver sem a renda de sua lanchonete (Michael Fox/Al Jazeera)

Autoridades estaduais disseram que a tragédia das enchentes foi o pior desastre climático da história do sul do Brasil. Especialistas acreditam que os custos de reconstrução no estado do Rio Grande do Sul, no extremo sul do Brasil, podem ascender a cerca de 4 mil milhões de dólares. Mais de 90% dos municípios do estado foram impactados – 2,3 milhões de pessoas.

A escala da área afetada é enorme. O Rio Grande do Sul é maior que o tamanho do Reino Unido. Seiscentas mil pessoas foram expulsas de suas casas. Cinquenta mil ainda estão em abrigos. Os escombros cobrem as ruas de cidades de todo o estado, enquanto os moradores retiram seus pertences outrora preciosos e esperam que sejam recolhidos pelas equipes de limpeza da cidade.

Algumas áreas foram mais atingidas do que outras. Seções inteiras de cidades nas montanhas ao norte e oeste de Porto Alegre foram destruídas por rios inundados, que levaram casas, lojas e empresas.

A cidade de Arroio do Meio foi uma das mais atingidas. O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, visitou-o na semana passada e caminhou com os moradores por quarteirões que não existiam mais – varridos pelas enchentes.

Na capital paulista, a devastação pode ser resumida como a história de duas cidades. As zonas baixas perto do rio, incluindo a Câmara Municipal e o centro histórico da cidade, foram inundadas como nunca antes. Enquanto isso, alguns bairros mais altos nas encostas pareciam continuar normalmente, exceto que a eletricidade e a água foram cortadas durante vários dias, pois as bombas e a rede elétrica foram desligadas.

Agora, a cidade está ressurgindo, mas é um processo lento. A previsão é que o Aeroporto Internacional de Porto Alegre fique fechado até o final do ano. Até a semana passada, os bairros de Humaitá, Sarandi e Ilhas ainda estavam submersos.

O presidente Lula prometeu US$ 10 bilhões para a recuperação do estado. O Novo Banco de Desenvolvimento – anteriormente conhecido como Banco de Desenvolvimento dos BRICS, criado pelos estados do BRICS e liderado pela ex-Presidente brasileira Dilma Rousseff – prometeu mais mil milhões de dólares.

No entanto, levará algum tempo até que a reconstrução comece. As chuvas contínuas, os ventos fortes e as falhas na infra-estrutura atrasaram os esforços de recuperação.

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