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Ultimamente, tenho me deparado com a palavra “fantasma”. Elegante neologismo criado pelos ingleses para designar o desaparecimento repentino e completo de uma pessoa como forma de encerrar um relacionamento interpessoal. Manifesta-se como uma rejeição não mútua, sem causa óbvia, deixando a outra pessoa atordoada.

A amizade é algo que desaparece? Como um amigo pode se tornar um fantasma? Como acontece esse abandono? O amigo pode desaparecer sem avisar, de forma abrupta ou sutil, mas será sempre uma ruptura, uma brutalidade, uma violência, que pode ser moderada ou praticada com delicadeza.

Há quem tente esconder fingindo que não virou as costas, porque não consegue dizer abertamente que vai embora, que não quer mais. Preferem não ser explícitos, porque querem manter a porta aberta. Eles vão embora e adotam uma atitude passiva, demorando para acomodar a situação, num misto de cortesia e egoísmo.

Mandam mensagens esporádicas, ligam no Natal e, quando um familiar morre, até mandam flores. Ambiguidade que representa ofensas mesquinhas, abandono cruel, forma covarde de evitar o confronto, falta de coragem para explicar o desaparecimento. Ainda há quem desapareça para sempre, sem deixar rastros. Porém, se não eram próximos, era porque não havia amizade.

Amigos autênticos não agem dessa forma. São pessoas em quem você pode confiar, ajudar uns aos outros, compartilhar histórias de vida, afinidades, semelhanças, admirações, experiências, opiniões, interesses, códigos de ética e rir pelos mesmos motivos. Eles estão ligados pelo afeto.

O inexplicável desaparecimento sem adeus em um relacionamento amoroso também é doloroso. O rejeitado torna-se um lugar despovoado, escondendo-se do mundo para sofrer na solidão. Talvez fosse agressivo dizer-lhe que já não cumpre os seus padrões de afecto ou que sentiu que não tinha essa obrigação.

Quando os relacionamentos amorosos se tornam impossíveis ou terminam, desaparece um futuro que não será compartilhado, embora nada esteja garantido porque o futuro é uma hipótese que pode não ser confirmada. Dolorosamente, as memórias permanecerão porque não podem ser removidas dos corações e mentes de ninguém.

Deveria haver um protocolo para todos os tipos de rompimento de relacionamento, uma espécie de cerimônia de despedida. Talvez o ritual tenha ajudado a outra pessoa a compreender e aceitar os motivos da saída, funcionando como curativos para aliviar o sofrimento. Seria um ato de grande nobreza.

Existem alguns desaparecimentos inesperados, normais à existência humana, que deixam tristeza, saudade e melancolia. Por exemplo, quando alguém que você ama morre. O futuro que não será compartilhado desaparece, deixando uma história de vida que ficou órfã, um mundo podado e uma alma vazia.

Ainda há amigos que partiram por outros motivos, sem deixar rastros, mas sem intenção. Acontece quando deixam de ser colegas de escola, amigos de universidade, frequentam os mesmos lugares, o mesmo bar, têm as mesmas opiniões ou porque se mudam para longe.

Nestes casos não houve ruptura. Foi o tempo, a distância e as divergências que provocaram a separação. São situações frequentes, não planejadas e que não caracterizam o fim de uma amizade, o que é sempre uma pequena tragédia. É importante saber que esses fatos podem afastar amigos, mas não acabar com amizades verdadeiras.

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