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Quando o governo português anunciou as 41 medidas de Plano de Acção para a Migraçãoem junho deste ano, uma das principais mudanças para os estrangeiros que desejam morar em Portugal foi o fim da Manifestação de Interesse. Foi o documento que deu início ao processo de legalização de pessoas que entraram no país como turistas e depois solicitaram autorização de residência.

O primeiro-ministro, Luís Montenegro, justificou as medidas com um discurso humanista: “Sem portas fechadas, sem portas escancaradas. Entendemos que é necessário regular a imigração para dar dignidade às pessoas.”

Contudo, os prazos para as pessoas obterem vistos de trabalho para entrada legal em Portugal, a partir do momento da entrega dos documentos, não indicam respeito pelas pessoas. O atraso é de pelo menos 120 dias.

“Desde que apresentei os documentos no consulado português para o visto de trabalho, foram necessários 127 dias para que tudo se resolvesse. Solicitei no dia 20 de fevereiro e consegui o visto no dia 26 de junho”, conta Jonas Gutemberg da Silva, 34, pernambucano.

O caso de Silva ocorreu no Vice-Consulado de Portugal em Recife. Ele ficou sem informações por 80 dias. “Não consegui acesso, eles não atendiam ligações, não respondiam e-mails”, reclama. Somente após esse período foi recebido pela primeira vez. “Disseram que a culpa foi do sistema pela mudança de plataforma”, diz ele.

Atualmente, Silva está na Covilhã com a mulher, por causa do preço da habitação. “Tínhamos a intenção de ficar em Lisboa, mas o aluguer era muito caro. Na Covilhã pagamos 400 euros (R$ 2.400) por um estúdio”, conta.

A mudança para Portugal o fez migrar para outra área de trabalho. No Brasil, foi vendedor de uma loja de shopping. No novo país, ele é entregador. “Viemos para o desafio”, diz ele.

As férias atrapalham

Em São Paulo, Pedro Moraes, 31 anos, entregou os documentos à empresa VFS, que elabora processos de vistos de trabalho em Portugal, no dia 7 de março. “A empresa enviou os documentos ao consulado no dia 22 de março. 10º”, relata.

Não houve muitas explicações para o atraso. “Quando perguntei sobre a data de entrega, apenas me orientaram a não comprar a passagem porque poderia demorar”, lembra o paulistano.

Morando em Águeda, onde conseguiu um quarto por 300 euros (R$ 1.800) mensais, Moraes está em busca de trabalho. “O ruim do atraso do visto é que cheguei a Portugal na época de férias. Estou enviando meu currículo, indo para a fábrica, mas dizem que só será em setembro”, afirma.

Formado em Segurança do Trabalho, o último emprego que teve no Brasil foi como analista de compras. Trabalhou em logística, foi estoquista, motorista e operador de empilhadeira.

Imigrantes necessários

As dificuldades na obtenção de vistos de trabalho ou de autorização de residência ameaçam o crescimento da economia portuguesa. Com cerca de 10% da população composta por imigrantes, o país depende de mão de obra estrangeira.

De acordo com o Banco de Portugal40% dos trabalhadores agrícolas e pesqueiros, 31% dos que trabalham em hotéis e restaurantes, 28% dos empregados em atividades administrativas e 23% dos trabalhadores da construção civil são estrangeiros.

Outra vantagem para Portugal, com a chegada dos imigrantes, é o saldo positivo da Segurança Social, o Plano de Pensões Português. As contribuições feitas por estrangeiros ajudam a financiar as pensões portuguesas. Dados do Observatório das Migrações relativos a 2022 indicam que, naquele ano, os imigrantes pagaram 1,861 bilhão de euros (R$ 11,2 bilhões) e receberam apenas 257 milhões de euros (R$ 1,6 bilhão).

Promessa de melhoria

Questionado pelo PÚBLICO Brasil sobre as dificuldades que os brasileiros enfrentam para obter um visto de trabalho, o Ministério das Relações Exteriores de Portugal — equivalente ao Ministério das Relações Exteriores do Brasil — afirmou que o objetivo é tornar mais eficientes os processos de avaliação de documentos.

“Está em curso um processo de reorganização interna dos postos consulares, para que possamos aumentar a capacidade de atendimento e melhorar os mecanismos de agendamento”, respondeu o ministério por escrito.

Uma das medidas para agilizar os processos será a contratação de 50 novos especialistas e analistas de vistos. Mas a competição ainda não foi lançada, o que significa que qualquer melhoria ainda levará meses, pois a contratação de servidores leva tempo.

O ministério também enfatiza que parte da culpa pelos atrasos é das pessoas que solicitam vistos. “Chegam milhares de pedidos com dados ou documentação em falta e, nesta circunstância, esses pedidos não são efetivamente processados, tendo mesmo de ser enviados para serem corrigidos. Eventualmente, isso pode ser uma explicação para o atraso”, explica.

Empresa intermediária

Atualmente, a maioria dos consulados portugueses exige que os documentos para pedidos de visto passem primeiro pela empresa VFS Global. O papel da empresa é preparar os processos, verificando se os documentos estão corretos, o que deve diminuir o trabalho dos consulados.

“A contratação de serviços a empresas como a VFS é uma prática generalizada entre os Estados, não apenas na União Europeia. Tratam-se de empresas certificadas, contratadas para apoio ao processamento de vistos, todas elas acreditadas pela UE e que estão sujeitas a acompanhamento permanente, quer pelos postos consulares, quer pela Direção Geral de Assuntos Consulares e Comunidades Portuguesas do Ministério dos Negócios Estrangeiros. , ou pela própria Comissão Europeia, no âmbito das avaliações Schengen”, acrescenta o ministério.

O brasileiro Marcel Mesquita, que trabalha numa empresa de transitários no Porto, critica os procedimentos da empresa VFS Global, que, na sua opinião, deveria facilitar os procedimentos para a obtenção de visto. “Eles sempre inventam alguma coisa, dão um jeito de cobrar mais pelo serviço”, diz.

Outra reclamação que ele tem é que a VFS Global envia duas vezes a mesma fatura para pagamento. “As pessoas enviam o comprovante de que o pagamento já foi feito e apenas dizem que está tudo bem”, relata.

Em vários grupos de aplicativos de mensagens para brasileiros que querem se mudar para Portugal, uma das dicas é adquirir mais alguns serviços VFS para agilizar o processo. Os serviços extras incluem envio de documentos por Courier, fotocópia, fotografia, atendimento sem agendamento, entre outros.

Questionada pelo PÚBLICO Brasil sobre as denúncias, a VFS respondeu que é um parceiro de confiança de 68 governos, com uma rede que atua em 153 países. Destaca ainda que o facto de ter vencido sete concursos internacionais no ano passado é uma demonstração da “confiança que os governos têm nas soluções tecnologicamente inovadoras que fornece, que são altamente seguras, fiáveis ​​e eficientes”.

Relativamente ao controlo realizado pelo Estado português sobre a sua atividade, a VFS destacou que existem “interações regulares com o Governo português, complementadas por reuniões mensais de avaliação. Além disso, auditorias surpresa são realizadas pelo Ministério das Relações Exteriores”.

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