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A legislação é clara: se os imigrantes sustentam os seus filhos e os mandam para a escola, devem receber uma autorização de residência em Portugal, mesmo sem visto. Isso é o que Lei de Estrangeiros (23/2007): “Cidadãos de países terceiros (…) que tenham filhos menores residentes em Portugal ou com nacionalidade portuguesa sobre os quais exerçam efectivamente as responsabilidades parentais e a quem assegurem a subsistência e a educação.”

Acontece que a Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), mantendo o que fazia anteriormente o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), só concede autorização de residência a quem tenha filhos a partir do sétimo ano de escolaridade. Segundo a advogada Priscila Corrêa, a posição está relacionada à interpretação do artigo 92, que dispõe sobre a concessão de autorização de residência a estudantes do ensino médio —em alguns países europeus, o nome secundário é atribuído a partir do sétimo ano de escolaridade. Para tentar que o parlamento português esclarecesse a situação, fez uma petição que pode ser assinado site da Assembleia da República de Portugal.

Sem agendamento

Para o camionista Luiz Fernando Carvalho, de 35 anos, o processo de pedido de autorização de residência junto da AIMA tem sido um caminho cheio de buracos. “Há três anos que tento o reagrupamento familiar e nunca consegui. Tenho um filho que está no oitavo ano de escolaridade e nem foi possível renovar a autorização de residência”, afirma.

Morando em Lisboa, Carvalho nem se arrisca a enfrentar as longas filas da agência que atende imigrantes. “O AIMAvocê precisa marcar uma consulta para ser atendido, mas ninguém consegue marcar. Sem hora marcada não adianta ir. Se você for, vai perder a viagem”, explica.

Atualmente, o motorista tem conseguido com o visto concedido aos cidadãos de Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP)por meio do qual obteve o status de igualdade de direitos, com cartão de cidadão que diz “cidadão brasileiro”. Dessa forma, ele consegue realizar seu trabalho, mas corre o risco de ser pego, como se estivesse ilegal. “Viajo por toda a Europa. Ninguém olha o verso do cartão de cidadão. E, quando olham, não entendem o que está escrito em português. Até agora, para mim, está funcionando”, diz ele.

Carvalho diz que trocou Goiânia por Portugal por causa da violência e para proporcionar uma vida melhor à família, mas sabe que a situação sem autorização de residência é incerta. Para resolver isso, ele está tentando fazer com que a AIMA cumpra a lei. “Tomei medidas legais para conseguir a nomeação. Mas é caro. Até agora gastei 1.700 euros (R$ 10,2 mil)”, detalha.

Muitos imigrantes não sabem como agir diante de dificuldades para obter atendimento na AIMA
Adriano Miranda

Espere

A professora Tayara Carlos, 36 anos, mudou-se de Arraial do Cabo, no Rio de Janeiro, para Portugal em setembro do ano passado, com os dois filhos, uma menina de seis anos e um menino de dois. Trabalhando em Braga, num centro de ensino, começou a procurar uma forma de legalizar a sua situação.

“Ao pesquisar, encontrei na internet a possibilidade de os filhos estudantes obterem autorização de residência em Portugal e, quando fui para Seguro SocialFui informado pelo atendente que esse direito realmente existe, desde que eu contribua há pelo menos um ano e um mês para a previdência social”, relata.

Ela decidiu esperar. Contratou um advogado de Cascais e vai intentar uma ação judicial em novembro, mês em que completará um ano e dois meses de contribuições para a Segurança Social.

A Lei dos Estrangeiros, porém, não estabelece prazo de contribuição para que crianças em fase de estudos tenham acesso a autorização de residência. Apenas menciona, cinco vezes, que quem requer autorização de residência deve estar inscrito na Segurança Social, além de prever que a sua situação deve ser regularizada.

Tayara sentiu em primeira mão a postura hostil da AIMA. “Muitos advogados não querem assumir o caso sem que o menor esteja pelo menos no sétimo ano de estudo”, afirma. Com capacidade financeira para enfrentar a AIMA na Justiça, ela acredita estar em melhor situação do que muitos brasileiros. “Muitas pessoas não tomam providências por causa dos gastos, mudam-se para Portugal sem condições financeiras para isso”, comenta.

Perdido

Há três meses em Portugal, Nubitania Maciel, 42 anos, que, no Brasil, era auxiliar administrativa, não sabe que medidas pode tomar. “Eu nem sei mais em que situação estou”, diz ela.

A residir em Mirandela, tem duas filhas, uma de cinco anos e outra de 25, que está em Portugal há dois. Atualmente dona de casa, um de seus problemas é conseguir trabalhar. “Não consegui encontrar lugar para deixar minha filha mais nova, por falta de vagas em creches públicas.”

Assim que a menina estiver matriculada na escola, ela solicitará uma autorização de residência. O problema é que a escolaridade obrigatória em Portugal começa a partir dos seis anos e ela não sabe se a pré-escola conta para a obtenção de autorização de residência.

Atendido

Para a manicure Carla Ribeiro, 42, a viagem do Rio de Janeiro a Portugal com o marido e o filho, em 2019, foi com visto de turista. “Mas assim que chegamos, meu marido e eu encontramos trabalho e decidimos ficar”, lembra ela.

Seu processo começou com a Manifestação de Interesse. Mas para obter a residência ainda demorava três anos. “Quando o meu filho estava no quarto ano de escolaridade, alguém me falou sobre o direito de ter uma residência para ele no sétimo ano”, destaca.

Carla só solicitou autorização de residência para o filho três anos depois. “No dia da entrevista, a atendente do antigo SEF disse-me que agora eu poderia fazer o reagrupamento familiar e aceitei. O cartão de residência chegou 15 dias depois da entrevista”, conta. Ela passou por todo o processo sozinha, sem ajuda de nenhum advogado.

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