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Uma petição para alterar o artigo 92.º do Lei dos Estrangeiros (Lei 23/2007) de Portugal conseguiu ultrapassar mil assinaturas no site do Parlamento luso. Com isso, a proposta terá que ser discutida em uma das comissões formadas por deputados.

A petição foi elaborada pelo advogado Célio Sauer, que atua com imigração. De acordo com o artigo 92.º da Lei dos Estrangeiros portugueses, os estudantes do ensino secundário podem ter autorização de residência desde que estejam inscritos nesse nível de ensino e estejam abrangidos pelo Sistema Nacional de Saúde ou tenham seguro de saúde.

Sauer aponta o problema que quer ver resolvido na legislação. “A lei não prevê autorização de residência para estudantes menores que ainda não frequentam o ensino secundário. Quantos menores que estão no ensino pré-escolar ou no ensino básico não têm direito a isso?”, questiona.

O advogado denuncia a injustiça da aplicação do artigo. “A verdade é que hoje os menores de sete anos, por exemplo, podem estudar, falar o português de Portugal, identificar-se como portugueses, mas não conseguem obter autorização de residência”, afirma.

Salienta que a situação é pior para as crianças cujos pais ou tutores entraram em Portugal com visto da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), porque este documento não dá direito ao reagrupamento familiar.

Mesmo inscritos na escolaridade obrigatória, os estudantes estrangeiros não têm direito a autorização de residência
Mário Cruz

Outra petição que vai na mesma direção de Sauer está coletando assinaturas. A ação foi ajuizada pela advogada Priscila Corrêa.

Sem prazo

As petições à Assembleia da República passam por um longo processo. Em primeiro lugar, os serviços do Parlamento realizam uma análise para perceber se podem ser discutidos. Uma petição que proponha algo que entre em conflito com a Constituição – por exemplo, a legalização do racismo – não é aceite. Passada esta fase, o documento é colocado no site da Assembleia da República para receber assinaturas. É o proponente do artigo quem estipula quanto tempo a petição deve ficar disponível para ser assinada.

Uma vez aceita a petição, seu destino depende do número de assinaturas obtidas. Se chegar a mil, como acontece na proposta de Sauer, a petição será discutida em um dos Comissões Parlamentares Permanentes. Se atingir 7,5 mil assinaturas, terá espaço em debates no plenário da Assembleia. Com 20 mil, será discutido como projeto de lei.

A decisão de Sauer foi não esperar por 7.500 assinaturas. “É uma questão urgente”, argumenta. A proposta deverá ser discutida na primeira comissão da Assembleia da República, de Direitos, Liberdades e Garantias.

Os grupos parlamentares foram questionados pelo PÚBLICO Brasil sobre sua posição em relação à proposta de alteração do artigo 92 apresentada por Sauer. Só o Livre respondeu: “A posição do Livre sobre esta matéria é que, para nós, faz sentido que os pais de todas as crianças que estudam em Portugal possam solicitar o reagrupamento familiar e obter uma autorização de residência em Portugal”.

Mudança na lei, se aprovada, garantirá direito a autorização de residência para estudantes de todas as idades
Daniel Rocha

Indefeso

Segundo o jurista Marcelo Rubin, presidente do Clube do Passaporte“é uma questão de justiça a mudança proposta (por Sauer) e que a legislação abranja as crianças em creches, jardins de infância e toda a escolaridade obrigatória”. Ele acredita que o artigo 92 da Lei de Estrangeiros tem dois problemas.

A primeira delas é prática: “AIMA (Agência para a Integração, Migração e Asilo) aplica o artigo arbitrariamente”, diz. A arbitrariedade reside no facto de, apesar do texto referir que os alunos do ensino secundário podem ter residência, a agência só emite autorização de residência para crianças a partir do sétimo ano de escolaridade.

O outro problema está na escrita. “O artigo 92.º está incompleto, pois não prevê o caso das crianças do ensino primário e pré-escolar. Até os filhos de portugueses que ainda não têm nacionalidade ficam desamparados”, explica.

A Casa do Brasil em Lisboa — a mais antiga associação de imigrantes brasileiros em Portugal — apoia a mudança proposta por Sauer. “Em prol da igualdade, é fundamental que todas as crianças do sistema educativo português, independentemente de ser público ou não, tenham direito à residência. Esse direito, que atualmente é aplicado às crianças maiores de 12 anos, que estão no sétimo ano de escolaridade, deve ser estendido às demais idades e às demais crianças”, afirma Cyntia de Paula, presidente da entidade.

Para ela, é uma questão de princípio. “Tudo o que é feito para garantir mais direitos aos imigrantes é fundamental. Principalmente, num momento como o que vivemos, com o fim das manifestações de interesse”, afirma.

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