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O filme Sílvio estreia nos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (09/12) com o ator e apresentador Rodrigo Faro interpretando Sílvio Santos. Ator, diretor e produtores afirmam que tentaram trazer para a tela um Silvio humano, que ninguém jamais viu. Para mostrar a pessoa, o senhor Abravanel, no lugar do apresentador e dono do SBT, escolheu um momento de sua vida em que ninguém sabe realmente tudo o que aconteceu.

O período escolhido, 30 de abril de 2001, abrange as quase oito horas que Silvio passou sob a mira de uma arma em sua casa em São Paulo. Quem a empunhava era o menino que, dias antes, guardava a sua filha Patrícia Abravanel sequestrado por uma semana, até que foi pago um resgate de R$ 500 mil.

Dois dias após a libertação de Patrícia, o criminoso Fernando Dutra Pinto foi encontrado em um apartamento por policiais. Ele conseguiu fugir, deixando ali quase R$ 460 mil (76,7 mil euros). Ao escapar, ele matou dois policiais. Ferido e com medo de ser morto, o sequestrador invadiu a residência do apresentador, e os dois permaneceram lá, cercados pela polícia e pela mídia. O sequestro só terminou com a presença do então governador Geraldo Alckmin, que garantiu proteção a Dutra, que se rendeu.

A pergunta que Sílvio desperta é: quão próximo o que é mostrado na tela chega do que realmente aconteceu? Os diálogos do filme reproduzem muito do que de fato foi dito por Silvio e pelos policiais ao negociar a rendição de Dutra. Mas as conversas na cozinha da casa, entre o sequestrado e o sequestrador, ou seja, o conteúdo principal do filme, nasceram no roteiro.

E o que foi dito ali não pode mais ser investigado. Silvio Santos nunca deu detalhes do sequestro e morreu no dia 17 de agosto. Dutra morreu na prisão, cinco meses após sua prisão. A polícia afirma que a sua morte foi causada por uma paragem cardíaca, enquanto ONG que defendem os direitos humanos afirmam que ele morreu devido a ferimentos causados ​​por tortura e negligência médica, sem provas.

Muitos bordões

Alguns episódios da vida de Silvio, desde menino, são contados em flashbacks. Outros atores personificam Silvio quando criança e jovem, e Rodrigo Faro tem, em algumas dessas viagens ao passado, a oportunidade de interpretar Silvio em ação, no palco, com seu vocabulário característico e frases que acabaram virando bordões. Mas o desafio do ator estava nas cenas tensas na cozinha, durante o sequestro, diz ele.

“Fiz o trabalho oposto ao que um ator normalmente faz. Começamos com o exagero e reduzimos, retirando a caricatura, até chegarmos a uma prosódia natural”, diz Faro. “Não fazia sentido interpretar o Silvio com aquele jeito de falar na TV, o Silvio que todo mundo gosta de imitar. Durante o sequestro, o Silvio fica encurralado, assustado, preocupado com a vida, com a família.”

Segundo o ator, quem teve a oportunidade de conversar com ele fora das câmeras sabe que, no dia a dia, seu jeito de falar era um pouco diferente. “Tive a honra e o prazer de conversar com ele no camarim, quando fui pedir permissão para fazer o filme. A pontuação ao falar pode ser a mesma, mas o volume e a projeção da voz são diferentes.”

O apresentador Silvio Santos morreu em agosto, aos 93 anos
Alan Santos/ Presidência da República

Durante as filmagens, Faro teve que se concentrar em separar o que chama de “pessoa jurídica”, que é o apresentador de televisão, e a “pessoa física”, o empresário senhor Abravanel. “No set, às vezes, Marcelo tinha que insistir comigo e gritar: ‘Menos Silvio! Mais Señor!’. Foi um grande desafio.”

Ações táticas

O episódio do sequestro de Silvio trouxe uma situação inédita para os negociadores do Gate, Grupo de Ações Táticas Especiais, da Polícia Militar de São Paulo. Pela primeira vez, uma negociação para o desfecho do caso foi feita com o sequestrado, e não com o sequestrador, porque Silvio conquistou a confiança do criminoso. “É daí que vem a genialidade, a inteligência emocional, a sabedoria, o poder de persuasão desse cara que transforma a situação”, diz Faro.

Para chegar a esse ponto, o filme avança na ficção e constrói uma suposta relação em que o sequestrador reconhece empatia em Silvio, que exerce uma influência quase paternal sobre o criminoso, interpretado por Johnnas Oliva.

Além de conhecer o bairro onde o menino morava, o culto evangélico e outros locais frequentados por Dutra, o ator conseguiu comprar em um sebo uma biografia do sequestrador, que estava esgotada. “Ele é um daqueles meninos que não tem chance de educação, cultura, empatia, olhar carinhoso. Ele era amado, um galã para as meninas que o adoravam. filme que não usamos usa termos como ‘mano’ e palavras ligadas ao banditismo.”

Oliva lembra que, após ter a ideia de sequestrar a filha de um homem rico para pedir dinheiro, Dutra comprou em uma banca de jornal uma biografia de Silvio Santos. Após lê-lo, decidiu que a vítima seria sua filha.

Para tentar aumentar a tensão na relação entre Silvio e Dutra, Faro e Oliva decidiram passar todo o período de filmagens separados. A ideia era que eles se encontrassem apenas nos momentos de gravação. “Até almoçamos separados. Acabamos assumindo os personagens. Foi ótimo para aumentar a tensão. Depois das filmagens ficamos amigos”, conta Oliva.

A morte recente de Silvio deve aumentar o potencial de bilheteria do filme, que tinha data de lançamento marcada meses atrás. “Tudo o que aconteceu nas últimas semanas deu a este filme um clima de emoção, de saudade. Inicialmente era uma homenagem a ser feita em vida, mas Deus não quis assim”, afirma Faro.

PÚBLICO Exclusivo/Folha de São Paulo

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