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Minha irmã, Déia, sonhava em visitar Portugal. Não seria grande coisa se ela não tivesse uma deficiência física desde o nascimento, há 59 anos. Em São Paulo, onde moramos, isso nunca a impediu de passear, ver exposições e ir ao teatro. É raro o local que não possui rampas, banheiros acessíveis e elevador para cadeiras de rodas. Por que então eu não a ajudaria a realizar esse sonho?

Conheço Portugal e sei que Lisboa, Sintra, Óbidos são um desafio para os cadeirantes. Mas, na Internet, há diversas referências aos investimentos que o país tem feito em acessibilidade. Curta a página do projeto Os parques de Sintra são mais acolhedoresque cita um investimento de 2 milhões de euros (R$ 12 milhões) para permitir a visita de pessoas como Déia.

O site informa que o transfer para acesso ao icónico Palácio da Pena teria elevador para cadeirantes e equipamentos motorizados nos ajudariam a subir as encostas. Será? Decidimos dar uma olhada.

Na bilheteria, exigiram um atestado médico para comprovar que minha irmã tem dificuldade para andar. Estar em uma cadeira de rodas não é suficiente. Expliquei que abrimos mão do desconto para pessoas com deficiência, estávamos muito interessados ​​nos equipamentos que ajudariam Deia a chegar ao palácio. Aqueles que apareceram no site. A atendente disse que não sabia do que eu estava falando.

Aí já não existe o investimento de 2 milhões de euros. Faltou manutenção. A rampa de acesso ao transferir Está quebrado, o que me fez empurrar a cadeira sobre as pedras. Só quem já empurrou uma cadeira de rodas sabe como isso é difícil. Um guia, da Bahia, me ajudou a colocar Deia e a cadeira no ônibus, pois nem os equipamentos para embarque de cadeirantes funcionavam.

O pior ainda estava por vir: tive que deixar minha irmã sozinha na parada final e ir até a loja pedir ajuda. Ali, encostado num canto, estava o equipamento motorizado para puxar cadeiras de rodas. Estúpido. Só conseguimos subir porque um rapaz do serviço de informação, o André, nos ajudou. Ele disse que o pai dele era paraplégico, ele se emocionou e foi comigo buscar a Deia.

Em Óbidos, locomovemo-nos sem grandes receios graças aos romanos, que há séculos instalaram pedras lisas nas estradas. Deve ter sido pelas carruagens, mas os cadeirantes ficam gratos. O único banheiro acessível estava trancado. Quando pegamos a chave, entendemos: havia virado depósito de materiais.

Em Lisboa fizemos um tour naqueles autocarros vermelhos. Saltamos em alguns pontos, sempre com a ajuda dos pilotos. Classificação 10 para o serviço privado! No Castelo de São Jorge informaram à bilheteira que havia rampas de subida. Mas as rampas são feitas de pedras e só chegamos ao topo graças à ajuda de dois turistas americanos, que pareciam marinheiros. Mas ver minha irmã emocionada com a vista fez tudo valer a pena.

Em todos os lugares há descontos para pessoas com deficiência e isenções para acompanhantes. Uma demonstração de boa vontade. Mas preferimos pagar o preço integral do que enfrentar tantos obstáculos. Um detalhe: em todas as visitas que fizemos, Deia era a única sentada na cadeira. Por que seria?

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