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As últimas semanas do verão foram marcadas por tragédias envolvendo centenas de incêndios, perdas materiais e, principalmente, vidas humanas. Diante disso, sinto-me civicamente obrigado a utilizar este espaço que me é generosamente cedido pelos editores para escrever em memória do heróis da vida real que nos deixou e em homenagem aos muitos que ainda estão aqui.

Nascido e criado no Rio de Janeiro, tive dificuldade em compreender como funciona o coração do sistema de proteção civil português, algo que talvez muitos imigrantes brasileiros ainda não saibam: a esmagadora maioria dos bombeiros em Portugal são voluntários. Sim, não fazem parte de uma carreira estatal; São pessoas que, por pura abnegação, arriscam a vida paralelamente ao exercício de profissões comuns e, na verdade, remuneradas.

Tenho o privilégio de ter bombeiros na minha família portuguesa. Durante muitos almoços de domingo, senti a ausência do meu primo Adriano, sempre ocupado com suas obrigações de veterano bombeiro voluntário. Em muitas ocasiões, vi Adriano levar colegas fardados para fazerem refeições em sua casa, geralmente com pressa, em momentos de breve descanso entre um atendimento ou outro ou em um raro dia de folga.

Mas foi assim, com esta interação apressada, que percebi a principal virtude dos bombeiros deste país: são como uma família. Nas palavras de Adriano, “uma pessoa não é bombeiro, nasce bombeiro. Ela sai de casa sem nem olhar para trás para ajudar a família dos outros.” Nada mais autoexplicativo.

É impossível não se emocionar com as imagens divulgadas na imprensa na semana passada, retratando a tristeza dos colegas que acompanharam os cortejos fúnebres dos bombeiros mortos. Momentos como esse nos fazem lembrar da dimensão humana dos heróis que não usam capa nem têm superpoderes. Pelo menos não aqueles com os quais nos encantamos quando crianças, mas que carregam dentro de si uma superforça que os torna gigantes em situações onde a maioria de nós só conseguiria encolher de medo.

A sua magnitude, no entanto, é inversamente proporcional aos escassos recursos que os Orçamentos do Estado deste país atribuem às suas atividades. É uma tragédia anunciada e que, a cada ano, deixa mais vítimas. Dados da Liga dos Bombeiros Portugueses (LBP) indicam que mais de 250 bombeiros morreram em serviço nos últimos 44 anos, cinco só em 2024.

Além de simplesmente ignorar uma função básica do Estado, a de garantir a segurança dos seus cidadãos, o governo não é capaz de fornecer meios adequados para que os voluntários exerçam o seu heroísmo. Este ano, a base orçamentária previa menos de 40 milhões de euros (R$ 240 milhões) para apoiar todo o corpo de bombeiros do país. Mas até quando a sociedade fingirá a importância desta classe ou lembrará dela apenas quando necessário?

Há uma frase emblemática pintada na parede de um quartel de bombeiros do Rio de Janeiro: “Somos bombeiros: nada de humano nos é indiferente”. Então, quem somos nós para sermos indiferentes aos bombeiros voluntários? Mas ainda há tempo para mudar esta situação. No Brasil, vários estados instituíram o chamado imposto contra incêndio, cuja arrecadação serviu para capitalizar a atuação dos bombeiros.

Em Portugal a necessidade de recursos também existe e é muito simples ajudar: procure as Associações de Bombeiros Humanitários dos locais onde reside, junte-se a elas e contribua financeiramente para a manutenção das funções dos voluntários. Os bombeiros também precisam da nossa ajuda.

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