Os artigos elaborados pela equipe do PÚBLICO Brasil são escritos na variante da língua portuguesa utilizada no Brasil.
Acesso gratuito: baixe o aplicativo PÚBLICO Brasil em Android ou iOS.
Estimativas indicam que mais de 1,1 milhão de brasileiros (10,9% da população) possuem pelo menos uma deficiência física e mais de 2 milhões de pessoas têm mais de 65 anos. Os dados estão contidos no portal Acesso à Cultura e não Gabinete de Estratégia e Planeamento do Governo de Portugal, com base no censo demográfico de 2021, num capítulo sobre processos de acessibilidade. Segundo o texto, muitas destas pessoas estão impedidas de participar livremente na vida cultural do país, devido à falta de condições de acesso.
Foi com base nessas descobertas que o engenheiro paulista Paulo Nelson Araújo, 54 anos, trouxe a empresa do Brasil para Portugal Casa do Braileespecializada em sinalização visual e tátil, em que somente através do toque é possível incluir pessoas com deficiência visual em ambientes culturais, educacionais ou imagéticos.
Na Covilhã, interior de Portugal, Araújo conheceu Elisabet Carceller, 45 anos, natural de Barcelona, num café da espanhola no centro da cidade, que fica na Beira Baixa e é porta de entrada para a Serra da Estrela. Ele, especialista em projetos de acessibilidade e diretor da Casa do Braille, no Brasil, e ela, historiadora de arte e especialista em museografia, descobriram que poderiam transformar o museu da cidade numa referência de turismo acessível em Portugal.
Com o objetivo de contar como ocorreu a ocupação humana na região onde hoje está localizada a cidade, desde a pré-história até a atualidade, o Museu da Covilhã inaugurado em 29 de julho de 2021. No ano seguinte, ganhou o prêmio Museu do Ano da Associação Portuguesa de Museusque chamou a atenção para a questão da acessibilidade em edifícios públicos, estabelecimentos culturais e instituições privadas em território português.
O Museu da Covilhã tornou-se este ano a primeira instituição portuguesa a ser nomeada como finalista do Prémio Museu Europeu do Ano, da organização Fórum Europeu de Museus (EMF), criada em Londres, Inglaterra, que conta com 45 países membros e sede em Portimão, Algarve. Concorreu com museus famosos, como o Louvre e o d’Orsay, na França, e o Reina Sofia, em Madrid.
Crie acessibilidade
A iniciativa para quebrar a situação de falta de acessibilidade nos locais públicos do país, e especialmente na Covilhã, começou há seis anos, com uma série de coincidências que contribuíram para o sucesso da empreitada. O engenheiro conta que sua empresa fabrica as peças com base nas descrições e no monitoramento de Elisabet, que inclui sinalização no chão, sinalização tátil e mapas falantes.
O facto de o marido da historiadora, o arquitecto português Pedro Seixo Rodrigues, 47 anos, ser professor da Universidade da Beira Interior e conhecer o filho do engenheiro, o brasileiro Leonardo Araújo, 26 anos, que estuda nesta instituição de ensino, ajudou a aproximar as partes junto. para levar a cabo tal iniciativa.
Foi no café e espaço cowork A Tentadora, no centro da cidade, que o grupo discutiu como criar um museu totalmente acessível, que fosse um exemplo para todo o país. A conjugação de experiências e conhecimentos dos envolvidos foi fundamental para o desenvolvimento do projeto, que acabou por se tornar uma referência na área da acessibilidade em Portugal.
Elisabet, que vive em Portugal há 20 anos e há 12 escolheu viver na Covilhã, fala do museu com paixão e empenho. “Realizamos o projeto, desde o início, com muita dedicação”, sublinha, acrescentando que o prémio recebido pela instituição se deve essencialmente à acessibilidade.
Segundo a historiadora, “o júri do prémio revelou que o museu é um exemplo de boas práticas na área cultural e, com a visibilidade obtida, penso que outras cidades seguirão o mesmo caminho”, acredita. Para permitir a utilização do museu por pessoas com deficiência, inclui réplicas tridimensionais em relevo e em Braille. Ela conta que a instituição já recebeu diversos grupos com problemas visuais e outras limitações.
Elisabet acredita que a criação de instituições acessíveis não deve depender da iniciativa de poucos cidadãos. Para ela, o Parlamento brasileiro terá que se mobilizar para criar uma legislação adequada “que cause impacto” e atenda às necessidades de milhares de pessoas impedidas de ter acesso à cultura.
O representante da Casa do Braille em Portugal, Ricardo Gonçalves, 57 anos, tem como missão expandir a atuação da empresa e introduzir a cultura da acessibilidade nos municípios portugueses. As Câmaras Municipais de Lisboa, Santarém, Loulé, Reguengos de Monsaraz, Alcanena e Funchal já foram chamadas a adotar projetos semelhantes.
De acordo com os objetivos traçados pelo portal Acesso Cultura, declarado de utilidade pública no país, a promoção da acessibilidade deve ocorrer nas esferas física, social e intelectual, para a plena participação cultural dos cidadãos. Para tal, a instituição defende os seguintes objetivos, a implementar em todas as áreas da cultura:
- Colocar as questões relacionadas com o acesso – físico, social e intelectual – e a inclusão no centro da reflexão e da prática no sector cultural;
- Contribuir para a preparação técnica dos profissionais da cultura em matéria de acesso e inclusão, a fim de promover a mudança no terreno;
- Promover o diálogo e a reflexão sobre questões de acesso e inclusão em fóruns públicos;
- Intervir publicamente em defesa do direito de acesso à cultura e dos direitos culturais das pessoas.