Milhares de ucranianos se formarão em meio a preocupações de 'ficar ou partir'

A vida estudantil mal voltou ao normal depois da Covid-19, quando a Rússia invadiu a Ucrânia (Representacional)

Kyiv, Ucrânia:

Anton Yushyn passou quatro anos estudando italiano na universidade de Kiev, mas a eclosão da guerra lhe ensinou a lição mais valiosa de sua vida estudantil: priorizar o que é mais importante.

Quando se matriculou na Universidade Nacional Linguística de Kiev, a Rússia ainda não havia invadido, e suas principais preocupações eram socializar e passar nos exames para apaziguar seus pais.

“Talvez não tenham sido meus objetivos que mudaram, mas meus valores”, disse Yushyn, de 22 anos, à AFP no dia da formatura em Kiev, no mês passado.

“Antes tudo era festa e diversão. Agora é preciso passar mais tempo com a família e os amigos porque eles podem partir a qualquer momento”, disse ele.

Milhares de ucranianos que se formaram este Verão em cerca de 300 universidades estão a entrar numa sociedade transformada pela guerra – os seus futuros estão em dúvida, sem nenhum fim à vista para os combates.

À medida que a Ucrânia mobiliza jovens para reabastecerem as já extensas fileiras do exército, os homens formados enfrentam a perspectiva de serem convocados quando completarem 25 anos.

O ensino superior não ficou imune ao conflito.

Dezenas de professores e docentes têm lutado na linha da frente e um quinto das instalações do sector foram danificadas ou destruídas pelos bombardeamentos russos.

Em dezembro de 2022, um míssil caiu a apenas algumas centenas de metros do campus de Yushyn.

Para ficar ou sair

Mas no dia da formatura, o clima na alma mater de Yushyn era festivo. O perfume pairava no ar quente do verão e a equipe parabenizou os estudantes alegres por concluírem seus estudos diante da turbulência histórica.

A vida estudantil mal voltou ao normal após a pandemia de Covid, quando a Rússia invadiu em fevereiro de 2022.

As universidades suspenderam as aulas e a estudante de língua coreana Nikoletta Shova foi enviada pelos pais para ficar com parentes na Itália.

A jovem de 22 anos comparou o período “emocional” no exterior a estar em “estupor”, e ficou se perguntando se algum dia conseguiria retornar.

O ensino foi reiniciado na maioria das universidades apenas algumas semanas depois – online ou pessoalmente – quando as forças russas ainda estavam nos arredores de Kiev.

Shova voltou depois de três meses fora e conseguiu terminar seu curso pessoalmente enquanto arrecadava dinheiro para o esforço de guerra com colegas de classe.

Agora, com o diploma em mãos, a incerteza voltou.

Ela estava pensando em estudar no exterior – possivelmente marketing nos Estados Unidos – mas também estava aberta a encontrar um emprego criativo em casa.

Construir um futuro na Ucrânia apesar da guerra era possível, disse ela, tomando emprestada uma frase popular para sublinhar que seria necessária perseverança: “quem não corre riscos nunca bebe champanhe”.

Piadas, memes

“Então, estou sendo realista, mas com um pouco de positividade”, disse ela sobre seu futuro.

Daryna Dekhtiar, 22 anos, também formada pela Universidade Nacional Linguística de Kiev, ficou paralisada quando a Rússia invadiu.

“Eu não chorei nada. Apenas entrei no piloto automático”, disse ela, mas seus amigos também ajudaram a levantar seu ânimo, acrescentou ela.

“Criamos nossos próprios memes, nossas piadas, ficou tudo muito mais fácil”, lembrou ela.

Dana Andriichuk, que já havia conseguido um emprego de escritório ao se formar, estava correndo para encontrar amigos após a cerimônia.

Ela não queria se preocupar com o relativo conforto de seus anos de estudante nem passar muito tempo pensando na perspectiva de uma longa guerra.

“Estou tentando evitar ser uma pessimista presa ao passado. Quero viver agora e não no futuro, porque não sabemos o que acontecerá a seguir”, disse ela.

“Se o governo encorajar os jovens a ficarem e fizerem todo o possível para construir um futuro melhor, mesmo em estado de guerra – e a sociedade se tornar nacionalmente consciente – então poderemos considerar permanecer no país”, disse ela.

– ‘Não corra e se esconda’ –

Como milhares de outros graduados do sexo masculino, Yushyn não tem tanta liberdade de escolha. As autoridades proibiram homens com idades entre 18 e 60 anos de deixar a Ucrânia.

Milhares de pessoas partiram ilegalmente e dezenas morreram tentando.

Mas Yushyn estava resignado com a vida em casa.

“Homens de verdade não correm e se escondem. Se chegar a hora e eu receber uma intimação, não fugirei”, disse ele à AFP.

“Posso me enrolar, chorar, ficar sentado aqui tremendo o quanto quiser, isso não vai mudar a trajetória do foguete”, disse ele.

Seja qual for o futuro, ele disse que provavelmente não usará o italiano, mas está decidido a gastar seu tempo da melhor maneira possível.

“Eu preciso usá-lo ao máximo.”

(Exceto a manchete, esta história não foi editada pela equipe da NDTV e é publicada a partir de um feed distribuído.)

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