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O aviso prévio de greve dos funcionários da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) — eles exigem o pagamento de horas extras e o fim da jornada de trabalho nos finais de semana — provocou reações entre advogados e imigrantes brasileiros que dependem dos serviços do órgão para regularizar documentos em Portugal. O greve, marcada para começar em 22 de agosto e terminar em 31 de dezembro, se implementado, tornará os serviços ainda mais lentos. São mais de 400 mil processos atrasados.

Segundo o advogado Fábio Knauer, da Aliança Portuguesa, os serviços prestados pela agência tornaram-se um caso político. “Hoje, a AIMA é o epicentro de uma crise, um dos órgãos que mais desafia o atual Governo. A questão migratória foi muito debatida durante a campanha eleitoral e o Governo marcou uma data para resolver o problema, 30 de junho de 2025”, afirma.

Knauer explica que, se confirmada, a greve colocará em xeque todo o planejamento do Governo. “A informação de que a greve se prolongará até 31 de dezembro, mesmo que apenas sejam suspensas as horas extraordinárias e os trabalhos de fim-de-semana, é a prova de que a meta estabelecida não será alcançada. A imagem permanece de muita promessa e pouca eficácia”, afirma. Entre as medidas que o Governo anunciou está a abertura de um concurso para contratação de funcionários para ajudar a agilizar os processos.

Gláucia Pinheiro Belina, 71 anos, gaúcha, diz que está assustada com tudo o que está sendo obrigada a viver. Ela passou toda a manhã desta segunda-feira (08/12) na fila do AIMA para ser atendido. “Essa greve é ​​uma coisa muito triste, é desumana. Esta greve ocorre num momento extremamente difícil, porque muitas pessoas necessitam de documentos e registos. As pessoas não podem ficar sem documentos em Portugal”, afirma.

Ela acredita que a situação dos brasileiros e de outros imigrantes é atualmente pior do que quando o atendimento era prestado pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), que foi extinto. “O SEF já não era bom, mas o AIMA está pior. Se não estiver funcionando, é melhor fazer outra coisa, mas do jeito que está, não dá para continuar. Não é justo”, diz ela.

Gláucia, que foi professora no Brasil e, em Portugal, trabalhou em telemarketing e no setor imobiliário antes de se aposentar, entrou na fila por engano. “Eu tenho o Nacionalidade portuguesae vou para o Brasil passar dois anos. Quando o atendimento era no SEF, diziam que eu tinha que avisar quando ia me ausentar de Portugal por um longo período”, conta.

Informada que, por ser luso-brasileira, não precisava fazer nada na AIMA, destacou que era a terceira vez que enfrentava fila. A princípio, disseram que ela tinha que agendar a consulta. Na segunda vez, ela não conseguiu uma senha. “Esta é a imagem da desorganização”, lamenta ela.

Título de residência

Segundo Uelber Oliveira, 36 anos, motorista de ônibus baiano, a ameaça de greve dos funcionários da AIMA não faz sentido. “Acho um absurdo. Não faz sentido tratar as pessoas que pagam impostos de forma tão humilhante”, queixa-se. Morando em Portugal há três anos, ele elogia a segurança do país. “Na Bahia há muita violência urbana, tráfico de drogas. Decidimos mudar para Portugal para ter tranquilidade para criar meus filhos”, afirma.

Um dos filhos de Uelber nasceu em Portugal. Ele quer usar a nacionalidade do filho para tentar acelerar o processo de regularização no país. “Tenho autorização de residência da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Vim para a AIMA para tentar obter o documento de residência normal. Com autorização da CPLP, estou limitado. Tem muitos serviços que não consigo fazer”, diz, enquanto esperava na fila da agência na manhã desta segunda-feira.

Para a advogada Vanessa Bueno, o Governo é responsável por tudo o que está acontecendo. “Os problemas precisam ser resolvidos rapidamente. Foram publicadas 42 medidas após a posse da atual gestão, algumas delas envolvendo questões migratórias, mas quase nada está sendo implementado”, ressalta.

Fábio Knaeur acrescenta que a percepção entre todos é que há falta de coerência nas medidas do Governo, o que tem alterado muitas vezes a forma como os imigrantes devem obter documentos. “Inicialmente, o agendamento era feito por telefone. Depois, passou a ser feito no portal AIMA. Mas, no site, não há nem resposta automática informando que os processos foram recebidos. Isso deixa as pessoas no limbo”, critica.

Senhorita SEF

Lucas Cardozo, 29 anos, paulista, está em Portugal há oito anos e precisa de documento de residência. “Quando cheguei ao país ainda era o SEF e, para o bem ou para o mal, o processo estava a decorrer. Não com AIMA. Minha autorização de residência foi renovada automaticamente, mas não recebi o documento. Preciso fazer uma viagem e não sei se, quando voltar, serei parado no aeroporto. Não quero correr esse risco”, destaca.

Em contrapartida, Carlos Oliveira, 61 anos, natural de Hortolândia, interior de São Paulo, apoia a greve dos funcionários da AIMA. “Se eles estão trabalhando, deveriam ser indenizados. Eles podem receber horas extras ou ter folga, como acontece no Brasil. Se não for assim, não devem trabalhar”, destaca. No Brasil, trabalhou como motorista de ambulância. Atualmente trabalha no setor agrícola, perto da Figueira da Foz.

“Iniciei o processo para vir para Portugal em novembro do ano passado. Vim com visto para procurar trabalho”, diz ela. Ele tinha entrevista marcada para ontem na AIMA. Com a autorização de residência, Carlos pretende tirar a carta de condução portuguesa e voltar a trabalhar como motorista de ambulância.

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