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Em 2019, quando trabalhei na Fundação Nacional de Artes (FUNARTE)no Rio de Janeiro, Elisângela Souza, 51 anos, chegou à conclusão de que não poderia continuar. Ela cuidou dos editais de projetos dos equipamentos culturais e teatros da fundação no Rio. Mas, com o desmonte da política cultural levada a cabo pelo governo federal à época, ela renunciou.

Sem muita escolha, surgiu a ideia de cruzar o Atlântico. “Pretendia passar seis meses em Portugal para experimentar. Já tinha viajado para Inglaterra, mas nunca tinha estado no país”, afirma.

Era fim de ano quando chegou a Lisboa. Porém, dois meses depois, ele não pôde mais sair devido à chegada da pandemia e da confinamento. O jeito era procurar trabalho. “Consegui um contrato de um ano para trabalhar em um central de atendimento. Foi o que me deu a oportunidade de me organizar financeiramente em Portugal”, afirma.

Seu próximo passo foi trabalhar no censo, em 2021. Ele sentiu que havia ali uma questão política que envolvia o levantamento dos números da população. Apesar da existência de um grupo de trabalho composto por Alto Comissário para a Migração, SOS Racismo e outras organizações, que solicitaram a inclusão no censo de uma questão sobre como os portugueses se definiam em relação à etnia, esta não foi aprovada. “Se não há dados, não há políticas públicas voltadas para essas pessoas”, comenta.

“Loira de olhos verdes”

Depois de trabalhar no censo, tentou retornar ao seu campo de técnicas de produção cultural. “Depois de enviar muitos currículos, tive minha primeira oportunidade na minha área. Fui chamado para uma entrevista online. Eles avisaram que a conversa duraria 30 minutos. Quando liguei a tela do computador, do outro lado estava uma loira de olhos verdes. A entrevista durou apenas três minutos e fui rejeitado. Foi um choque de realidade”, lembra.

Não foi a primeira vez que Elisângela sentiu que a cor da sua pele mudou o seu percurso profissional. No Rio de Janeiro, fez curso de publicidade, mas acabou desistindo. “Os negros e a publicidade não são corresponder no Brasil”, ironiza. Acabou concluindo uma pós-graduação e um MBA em gerenciamento de projetos.

Já tinha sentido que não ser branca acaba por a enquadrar num estereótipo, mesmo em Lisboa. “Uma vez fui ao supermercado. Não tinha sacola. Como não tinha o que queria, acabei saindo sem comprar nada. Na saída, o caixa me disse para tirar o casaco para verificar se eu havia roubado alguma coisa.

Em vez de lamentar, a sua opção foi o que chamou de “transformar a narrativa da discriminação e da xenofobia”. Criou o IDE – Centro Social. “É um tecnologia social (tecnológico com foco em causas sociais), que visa trabalhar a agenda de inclusão, equidade, impacto social, inovação e sustentabilidade”, explica.

As atividades do IDE visam promover padrões ESG, sigla para Governança Social Ambiental. o que indica uma administração focada na inclusão, na igualdade e no meio ambiente. Formado em 2022, o reconhecimento do IDE não demorou muito. No primeiro Web Summit em Lisboa, Elisângela foi selecionada como representante do empreendedorismo social.

Ela também foi nomeada uma das 100 melhores mulheres em empreendedorismo social de 2023 Rede Euclidesa rede da União Europeia que visa criar um ecossistema para a construção de uma sociedade inclusiva, equitativa e sustentável.

O trabalho do IDE tem dois aspectos. O primeiro deles é direcionado a pessoas físicas. “Existem profissionais qualificados em grupos minorizados, como mulheres, migrantes, pessoas com mais de 50 anos, racializados, deficientes e LGBTQIA+, que não ocupam cargos de liderança porque os profissionais de recursos humanos não dão oportunidades”, afirma. E a outra vertente, dirigida às empresas, com o objetivo de realizar eventos personalizados com quem contrata, com vista ao desenvolvimento da agenda ESG.

Na próxima quinta-feira, dia 17 de outubro, Elisângela realizará a 2ª Edição do IDE Insight & Good Practices, no auditório da União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA), em Lisboa. O encontro, diz ela, reunirá palestrantes influentes e empresas que lideram a inclusão e a sustentabilidade.

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