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Ao procurar atendimento médico durante minha transição para a menopausa, me deparei com colegas sem preparo suficiente, outros sem empatia e, por vezes, ainda presos a um paradigma autoritário-paternalista da medicina (como o exercício do poder sobre os corpos). Como precisamos de mudanças.

Essa experiência singular me levou a reflexões profundas. O problema é complexo e multifacetado. Na rede pública e nos convênios privados, os médicos estão sobrecarregados e mal remunerados, o que contribui para a deterioração da qualidade da relação médico-paciente. Além disso, o avanço da literatura científica supera a velocidade de atualização das diretrizes clínicas, especialmente em áreas como a transição para a menopausa.

Este é um grande problema, pois o conhecimento progrediu rapidamente. Ao mesmo tempo, práticas duvidosas, como o uso indiscriminado de “chips e séruns de beleza”, tornam os profissionais sérios ainda mais céticos em relação às inovações legítimas, dificultando a distinção entre o que é baseado na ciência e o que é pura moda, tudo devido à falta de formação metodológica.

A outra face do problema: muitos médicos ainda reproduzem a lógica dos tempos em que nasceu a clínica — como descreveu Michel Foucault —, em que a medicina surgia como exercício de poder sobre os corpos. Muitas vezes, a abordagem ainda é autoritária, com o médico determinando o tratamento sem ouvir a perspectiva e os valores dos pacientes.

Moro em Portugal e, antes que alguém atribua isso a uma questão cultural, devo dizer que a minha pior experiência foi com um médico brasileiro. Nessa reunião recebi um misto de conhecimento técnico mediano e paternalismo autoritário, em que o que seria feito era determinado sem considerar minha opinião ou meus valores preferidos. Alguém que provavelmente nunca ouviu falar de cuidado centrado no paciente.

Diante desse cenário, pergunto-me: o que pode ser feito de forma sistêmica para melhorar a qualidade da assistência médica? Se eu tivesse o poder de implementar mudanças, minhas propostas seriam as seguintes:

1. Reformar o currículo médico, incluindo formação específica em perimenopausa e menopausa, bem como sono, exercício e nutrição. Também é crucial incluir formação em metodologia, ciência da tomada de decisões e cuidados centrados no paciente.

2. Estabelecer reavaliações periódicas a cada cinco anos para os médicos, algo semelhante ao que já é feito para a renovação da carteira de habilitação.

3. Incentivar as associações médicas a fazerem parcerias com instituições sérias, como a Cochrane, para oferecer cursos de metodologia, essenciais para a tomada de decisões.

Finalmente, o maior desafio pode ser que os sistemas de saúde pública e as companhias de seguros enfrentem o envelhecimento da população (maior proporção de doenças crónicas) e o aumento dos custos associados à incorporação de tecnologia na saúde, um cenário de crise sem resposta simples.

Talvez os investimentos em prevenção, tanto primordiais quanto primárias, possam ser cruciais para reduzir a sobrecarga do sistema e, quem sabe, abrir caminho para uma assistência médica mais humana, competente e, sobretudo, focada no paciente.

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